Luz sobre as contas públicas |
Gil Castello Branco – Economista e um dos fundadores da Associação Contas Abertas |
É conhecida a piada do sujeito que pediu dinheiro emprestado a um amigo alegando que a mulher estava grávida, prestes a ter o bebê, e ele, despreparado. O amigo, esperto, respondeu-lhe: “Se você, que já sabia disso há nove meses, está despreparado, imagine eu, que acabo de ser informado”. A história vem à tona na ocasião em que algumas prefeituras tentam adiar a vigência da Lei Complementar 131, que determina a divulgação das receitas e despesas na internet, de forma online e pormenorizada. A Lei da Transparência, de autoria do ex-senador João Capiberibe, foi a única emenda à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que completou recentemente 10 anos. A nova redação foi aprovada em 27 de maio de 2009 e deu prazo de 12 meses para que a União, os estados, o Distrito Federal e as prefeituras com mais de 100 mil habitantes se adaptassem. Agora, às vésperas da vigência efetiva, surgem os despreparados. O governo federal também contribuiu para a polêmica ao demorar a regulamentar a lei, o que já deveria ter feito há bastante tempo. Em parte, validou as desculpas das prefeituras que ainda não adotaram as providências necessárias. Com o impasse, fica a dúvida do que irá acontecer a partir de 28 de maio. O ideal é que os estados, o Distrito Federal e aproximadamente 275 prefeituras, neste primeiro momento, passem a informar pela internet o quanto arrecadam e como gastam o dinheiro dos contribuintes. Posteriormente, todas as cidades deverão fazer o mesmo, em diferentes prazos, conforme o tamanho da população. A rigor, quem descumprir a legislação terá suspensas as transferências voluntárias do governo federal. Os portais eletrônicos deverão conter, entre outras informações, o orçamento previsto, a origem da receita (impostos, taxas e contribuições), os nomes das pessoas, instituições e empresas beneficiadas pelos pagamentos, o que foi comprado, os serviços prestados, as licitações, os contratos e os programas implementados. A divulgação das contas públicas é um dos princípios do artigo 37 da Constituição Federal. O Estado deve dar conhecimento à população sobre como administra os seus recursos. Sob essa ótica, a publicidade pode ser analisada como sinônimo de moralidade. Considerando que a transparência é a principal inimiga da corrupção, espera-se que a sociedade civil organizada acompanhe as informações divulgadas e exerça maior fiscalização sobre os dispêndios governamentais. É provável que o controle social aprimore a qualidade do gasto e a própria cidadania. Mas, para que os brasileiros participem efetivamente, é indispensável ampliar o acesso à informação, tal como preveem as convenções contra a corrupção das organizações das Nações Unidas (ONU) e dos Estados Americanos (OEA). Nos últimos anos, diversas iniciativas contribuíram para aprimorar a divulgação do orçamento no Brasil, como a implantação da Lei de Responsabilidade Fiscal e a criação de diversos sites, como o Siga Brasil, do Senado Federal, e o Portal da Transparência, da Controladoria-Geral da União. Além disso, tramita no Congresso Nacional projeto de lei específico sobre o acesso à informação, encaminhado pelo Poder Executivo (PL 5228/2009), o qual já foi aprovado na Câmara dos Deputados. A proposta obriga os gestores a disponibilizar qualquer documento solicitado, exceto os relacionados à segurança do Estado ou à individualidade do cidadão. Há quase um século, o juiz americano Louis Brandeis disse que “a luz do sol é o melhor dos desinfetantes”, referindo-se ao sistema financeiro. Segundo o magistrado, os banqueiros costumavam se safar ilesos das crises financeiras, enquanto o ônus recaía sobre a cabeça dos poupadores da classe média. No Brasil, apesar do clima tropical, ainda vivemos nas trevas no que diz respeito, principalmente, à visibilidade das contas estaduais e municipais. Assim, daqui a alguns dias, vamos saber se a Lei Complementar 131 será mesmo praticada. Por aqui, infelizmente, nem todas as leis “pegam”. Sem dúvida, existe uma luz no fim do túnel e a transparência certamente virá, mais cedo ou mais tarde. A criança vai nascer em breve, estejam ou não os pais preparados. |
2 Comentários para "Publicado no Correio Brasiliense"
Artigo apropriadíssimo para a atual conjuntura política do Brasil. Vamos aguardar os acontecimentos, tomara que não seja somente mais uma lei nesse país de um milhão de leis que na escência não vigoram.
Eu só quero ver as publicações das contas de certos setores como Assembléia Legislativa, SETRAP, SEINF, CEA, SDR, Prefeitura de Macapá, pois licitações quase não acontecem e quando acontecem é para apadrinhados em superfaturamento de compras e serviços e o dinheiro do duodécimo mensal some de uma hora para outra.
Agora eu quero ver a onça beber água …