Por onde andei: montanhas douradas do Amapá

Macapaense nascida e criada, cresci com a frustração de não conhecer com profundidade o estado para além da capital. Com o passar do tempo, as visitas ao sítio da família tornaram-se cada vez mais raras, conforme eu crescia e perdia o interesse pela desconexão da velocidade cotidiana. Fora, seis anos sem ultrapassar Ferreira Gomes nas veias abertas do Amapá. 

Mas o jornalismo se encarregou de me voltar o foco para os caminhos de dentro, justo eu, que em 2018 começava a trilhar meus projetos e trabalhos em outros lugares do Brasil. Foi por um trabalho de campo e produção de um documentário que eu conheci o garimpo pela primeira vez. Foram longas horas de viagem, dois atoleiros, sufoco e suor até chegar no Lourenço, a primeira parada da equipe de filmagem do documentário Utopia, de Rayene Penha, diretora do filme e minha amiga. À primeira vista, aquele foi o cenário mais distópico que presenciei a olhos nus, de um vilarejo cortado por uma reta que terminava na montanha barrenta. De céu coberto por nublado com sol tímido o dia todo, lá se amanhece no escuro e se recolhe ainda na claridade do fim de tarde. 

A onipresença do barro em minhas roupas pesava no corpo junto da bota sete léguas, meu sapato oficial da viagem. Foram quatro dias seguidos de manhãs e tardes no sol, e noites no único restaurante da rua principal, sempre fechando a jornada de filmagem com um bom e velho prato feito. De lá, seguimos para o garimpo do Vila Nova, com montanhas não tão imponentes, mas recepção mais acolhedora. Depois de alguns perrengues com a nossa instalação, os moradores ofereceram o centro de convenções da vila, onde nos acomodamos depois de tomarmos banho de cuia na casa do vizinho que morava logo ao lado. 

O sono não era pleno, fosse pelo agonia do mosquiteiro ou olhar de espanto, como se tivesse visto algo pela primeira vez. E eu tinha, mesmo. Conhecer o garimpo foi, de longe, a viagem mais desconfortável de minha vida. Ali, sequer houve espaço para um descanso, que tinha a exaustão compensada no riso ou no luxo de uma garrafinha de água tratada e fruta fresca para lanchar. Não voltei a mesma desses lugares, mas, com certeza, voltei mais atenta e entregue às ruas que correm pra dentro do meu Amapá, já que agora eu sei que os milagres de gente moram do meu  lado, e com dente de ouro enfeitando o sorriso. 

 

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