Ecofeminismo e o consumo consciente do mercado da moda

As discussões sobre o protagonismo feminino e a participação da mulher nos diferentes espaços sociais têm atingido esferas além de políticas, culminando na proposta de Greve internacional das Mulheres e demais manifestações. Os desdobramentos da primavera feminista florescem com a quinta onda e levantam pautas alinhadas à contemporaneidade, entre reivindicações milenares e atuais. A luta segue por direitos trabalhistas, econômicas e sexuais agregam também as reflexões ambientais e ecosustentáveis. 

Embora 8 de Março tenha se tornado uma data de celebração após o modelo de produção capitalistas se apropriar dela, tornando-o mais um motivo para a movimentação da economia mundial, a instituição desse dia como Dia das Mulheres nasceu da luta operária contra a dinâmica da indústria que, hoje, comercializa essa causa em estampas e produtos. 

Não obstante a essa realidade, a indústria têxtil, segunda maior indústria em confecção e geração de emprego no mundo, é formada 80% por uma mão de obra feminina e ainda perpetua em sua estrutura empresarial a lógica criada pela Revolução Industrial. Com substituição simbólica do homem pela máquina (posto que o trabalho braçal não foi extinto, apenas desvalorizado) a necessidade de produzir mais peças e em menos tempo ditou o novo ritmo, mesmo que isso significasse a queda da qualidade dos produtos. 

Nunca foi tão fácil comprar um algo gastando tão pouco. O ritmo acelerado da indústria têxtil aliado ao universo da moda faz com que a população, majoritariamente formada pela classe trabalhadora, possa incorporar e consumir o que é tido como legítimo de forma muito mais rápida.  O lançamento constante de tendências no mercado acaba por determinar a frequência em que o consumidor compra um produto. E isso muitas vezes não parte da necessidade, mas do desejo de pertencer ao padrão igualmente estabelecido pelo capitalismo. 

O falacioso discurso de acessibilidade e democratização do consumo é respaldado nesse sistema de produção em larga  escala e de baixo custo, mas é estruturado em uma tríade de base negligenciada. Um produto não é produzido sem matéria prima, mão de obra e investimentos em tecnologias para a sua realização. O reflexo disso são mercadorias baratas, mas que  carregam por trás a omissão com algum dos elementos desse método, em suma, a mão de obra barata e condições análogas à escravidão. A violência faz parte do cotidiano da indústria têxtil brasileira, que tem 64% da sua produção feita por mão femininas, em condições precárias e insalubres nas produções. 

É indubitável dizer que o campo da moda tem como público alvo mulheres. E ao mesmo tempo em que somos o maior número de consumidoras, estamos sujeitas a perpetuação de uma das maiores violências do sistema patriarcal: padrões estéticos e de beleza, comercializados maciçamente por esse nicho. 

Com a pandemia do Novo Coronavírus, o movimento das lojas on-line cresceu em 95%, permitindo um faturamento 300 vezes maior para o ramo de vestuário. Mas às custas de quem? A não paralisação das máquinas em meio a uma crise sanitária mundial evidencia um problema que se perpetua no tempo: o baixo custo de uma peça, na verdade, custa a vida de pessoas. 

Racionalizar o consumo faz com que a compra de maneira automática deixe de ser reproduzida, reduzindo gastos financeiros, mas principalmente, reduzindo a produção individual de lixo e desperdício de água e outras matérias naturais de subsistência para a vida humana. A compreensão do real valor e vida útil de um produto e da necessidade em tê-lo. O consumo consciente não é deixar de consumir, mas saber o que consome e de onde consome, e, que se investe tempo e dinheiro. O que está por trás daquele objeto e assumir uma responsabilidade com todos os envolvidos: pessoas e natureza. 

Entender que a lógica social do capitalismo é pensada para explorar mulheres que estão dos dois lados dessa dinâmica e por isso, romper com essa dinâmica é posicionar-se contra a exploração feminina. Não só trabalhista, mas corporal, na maneira como mulheres lidam com seus corpos, suas identidades e comportamentos sociais. Abrir mão do uso de mercadorias e do interesse particular por uma peça é engajar um movimento que objetiva não só a emancipação de mulheres, mas a preservação do meio ambiente. 

Mudar a percepção sobre a vestimenta e se desviciar do olhar de tendência para alcançar a esfera de linguagem é o ponto que interliga a revolução fashion com a revolução ambientalista. Entender a moda como ferramenta comunicativa e portanto, como narrativa é desprender da dependência de “novo”, porque a proposta é comunicar o que sou e penso enquanto pessoa quando visto alguma coisa e não que discurso visual reproduzo pela massa.

Mulheres em fábrica têxtil nos anos 30.

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