Contratações públicas em época de pandemia: riscos de integridade

* Márcio Augusto Alves. Procurador de Justiça do Ministério Público do Amapá 

Faz aproximadamente quarenta dias que nosso país, Estados e municípios estamos convivendo com a pandemia do COVID-19. Para atender às situações emergencialmente criadas pela pandemia, todas as administrações públicas (federal, estaduais e municipais) precisam realizar contratações (obras, serviços e compras) que não estavam devidamente planejadas para acontecerem nesse período (respiradores, EPIs, construção de hospitais de campanha e outras ações importantes).

Nossas Administrações Públicas, porém, têm um histórico e cultura de desvios e improbidades nessas contratações, ainda que sejam planejadas e em tempos de normalidade, e isso somente se agrava quando as mesmas devem acontecer em caráter de urgência e extrema necessidade, como nesse tempo de quarentena; aí os riscos de violação à lei de licitações e à lei de improbidade administrativa só tendem a aumentar, e a necessidade de monitoramento dessas contratações precisam ser coletivas, e em especial nesses tempos de redes sociais e compartilhamento e velocidade de informações pela internet.

Portanto, a prática mais comum, mesmo em tempos de normalidade, já é o descaso com o dinheiro público, por isso, nesses tempos de anormalidade, o controle e critérios de gestão sobre a coisa pública devem ser redobrados, pois é mais do que certo que há àqueles que se aproveitam da situação para ofertar valores exorbitantes de bens e serviços, assim como “facilidades” em troca de benefícios.

É importante, pois, que a Administração Pública e a privada possuam uma matriz de riscos que cuidem dessas situações emergenciais, a fim de mitigar os possíveis transtornos à integridade causados pelos “profissionais” antiéticos, os quais se aproveitam da situação emergencial para causarem ainda mais prejuízos à sociedade.

Não é à toa que as redes sociais estão pululando de desvios à integridade pública e os órgãos de controle estão cobrando a devida transparência nessas contratações por parte das Administrações. Para isso, muitas providências devem ser efetivadas para que os desvios sejam minimizados, tais como, dentre vários outros: exigir, minimamente, no edital, o balanço patrimonial e as demonstrações contábeis do último exercício; exigir certificados e/ou atestados que comprovem a capacidade técnicas das empresas concorrentes; realizar “due diligence” antes das contratações ou definir os fornecedores, a fim de investigar o histórico da pessoa jurídica ou física, pois a Medida provisória 926/2020 permite, em caráter excepcional, a “contratação de fornecedora de bens, serviços e insumos de empresas que estejam com inidoneidade declarada ou com o direito de participar de licitação ou contratar com o Poder Público suspenso, quando se tratar, comprovadamente, de única fornecedora do bem ou serviço a ser adquirido”. Também é fundamental que se crie um canal de denúncias, para que se possibilite a efetivação de denúncias anônimas e não apenas pelas redes sociais, assim como ter uma equipe idônea e qualificada para apura-las.

A integridade é um traço da personalidade de cada um de nós, cidadãos, e também de profissionais éticos, não sendo possível que, nesses tempos de crise na saúde pública, possamos abrir mão da ética, pois, ao contrário, é justamente nesses momentos que devemos assegurar que tudo deve acontecer da melhor maneira possível, pois se assim não for, os principais prejudicados serão os menos favorecidos social e economicamente, como todos já sabemos.

MÁRCIO AUGUSTO ALVES

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