Continuidade ou Alternância?

*Charles Chelala. Economista. Professor. Mestre em Desenvolvimento Regional

Estamos a uma semana das eleições em segundo turno que elegerá o próximo presidente do Brasil e o futuro governador do Amapá. Diante do momento e do cenário posto, gostaria de comentar um tema que julgo relevante no momento de decisão pelo eleitor. Trata-se da dicotomia “alternância de poder” ou “sequência da gestão”.

Antes de mais nada, é fundamental deixar claro que a essência da democracia é a garantia de que esta escolha seja feita pelo voto de forma direta. Dito isto e pesando as alternativas, não tenho dúvidas que, na maioria dos casos e em condições adequadas, o prosseguimento da gestão, sem guinadas de 180 graus, tende a ser mais vantajoso para a sociedade.

Defendo esta tese, primeiramente, em função do tempo na administração pública, que é notoriamente lento, em especial quando se recebe uma estrutura estatal destroçada. Quatro anos é um interregno ínfimo para arrumar a casa, captar recursos, elaborar projetos e executar obras e politicas públicas verdadeiramente estruturantes. Daí que, quase sempre, os segundos mandatos são melhores que os primeiros, pois o bonde já está andando.

Há também um aspecto que já abordei aqui: a “síndrome de Adão e Eva” que acomete os executivos de oposição quando ganham os governos. Rejeitam tudo o que remete ao antecessor, parando obras, alterando programas e até mudando denominação (lembram que o projeto “comunidades sustentáveis” teve seu nome alterado para o sucupirano “comunidades duráveis”?). Só os gastos com tinta para pintar todos os prédios públicos com a nova cor do partido vitorioso, já referendaria minha tese…

Há vários exemplos pelo Brasil afora. Vou citar dois, um do PT e outro do PSDB.

O grupo político liderado por Jorge e Tião Viana está à frente dos destinos do Acre há dezesseis anos. Tive a oportunidade de visitar aquele belo Estado no início, no meio e na atualidade deste ciclo e pude constatar como a continuidade de gestão propiciou ganhos reais aos acreanos. Por exemplo, a capital Rio Branco, no início deste século era uma cidade feia e descuidada. É impressionante que ações de governo, como o Canal da Maternidade, o calçadão da Gameleira e a recuperação do centro fez aquela cidade se estruturar e se embelezar.

O exemplo do PSDB é São Paulo, cujo grupo político é o mais longevo no país, iniciando sua gestão em 1995 com Mário Covas. Sem menosprezar os graves problemas do mais importante Estado do país, seguramente as administrações tucanas neste período tem sido muito superiores do que foram na época de alternância Maluf-Quércia…

Mas o leitor poderá me contestar com o exemplo do Maranhão, no qual as quatro décadas de poderio de uma família só fizeram piorar relativamente as condições do Estado. Retruco com dois fundamentos: é claro que a excessiva continuidade faz a gestão caducar, principalmente se as intenções do grupo no poder não são lá republicanas. Assim, faço questão de deixar claro que a sequência administrativa é boa até determinado ponto, depois perde a validade.

É uma lástima que as eleições no Brasil estejam tão pasteurizadas e tenham se transformado em um confronto de marketing vazio, na qual o conteúdo que verdadeiramente interessa como economia, capacidade de gestão e trajetória de vida dos postulantes seja substituído pela embalagem dos nauseabundos jingles e campanhas difamatórias. É curioso que, no Amapá, o quesito “simpatia” parece ser mais importante na decisão do voto do que os temas “competência” ou “honestidade”.

Seria ótimo se, no horário político, pudéssemos ver um debate aprofundado de aspectos como este, sobre continuidade ou alternância em face aos interesses da sociedade.

  • Fui outro dia na PMM e sinceramente pensei que estava na capital vizinha Belem do Pará.
    Tanta gente deste Estado nas salas refrigeradas da Prefeitura que tive essa sensação (apenas sensação).

  • Sou contra reeleição. Os que a tentam não conseguem fazê-lo sem o uso da máquina pública. É quase certo que a execução orçamentária nos anos de eleição é “diferenciada” dos demais anos do Governo. Duvido que eu esteja errado. Quem sabe deveríamos pensar em alongar mais os mandatos?

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