UMA HISTÓRIA DE MINÉRIO NO AMAPÁ. E A VERDADE DOS FATOS – Alto Tocantins e Ecometals

Por:  Bonfim Salgado  (*)

Há diversas maneiras de se começar uma história, assim como meios adequados e inconvenientes de criar, desenvolver e manter uma empresa. Na competição acirrada do mundo moderno, vence e tem sucesso quem permanece atento às tendências e comportamentos do mercado. Por isso, desde cedo, aprendemos que a trajetória das empresas destacadas, por várias razões, sempre estará ligada à performance de seus criadores, suas lideranças e também de seus patrocinadores.
No Brasil de hoje, isso pode ser observado numa das atividades mais importantes, pela sua abrangência social específica, o setor mineral. Considerado como um conjunto de ações – da simples transformação de banha animal em velas e sabões, até a complexa estrutura química necessária à produção e refino de petróleo, para a realidade dos combustíveis que tão bem conhecemos.

Primórdios

A verdadeira história mineral no então Território Federal do Amapá, começou nos primórdios de sua criação em 1943, pelo então presidente da República, Getúlio Vargas. O país, sob vários aspectos, atravessava um período político-administrativo conturbado, havendo resistências na oposição parlamentar – concentrada na capital do Brasil, no Rio de Janeiro – não só quanto à criação do novo Território Federal, mas também pelo custo inevitável inerente aos sistemas a serem montados, a fim de que pudesse funcionar em nova unidade federativa, perdida nos confins da Amazônia. Sem contar a natural resistência política do governo do Estado do Pará, que perdia, por desmembramento, parte considerável do seu território, justamente as áreas limítrofes com a Guiana Francesa e o Suriname, objeto de disputas históricas entre brasileiros, franceses, ingleses, espanhóis e portugueses.
Assim, Getúlio Vargas nomeou o capitão do Exército Janary Gentil Nunes que, na qualidade de primeiro governador do Território Federal do Amapá, aqui estabeleceu-se em definitivo nos primórdios de 1945, trazendo como primeiro lema a frase “Integrar  e Sanear.” Data dessa época a importante descoberta das minas de manganês em Serra do Navio, por um garimpeiro chamado Mário Cruz.
A partir daí, Janary Nunes, utilizando sua rede de amizades e contatos internacionais, contribuiu para viabilizar à nível do governo federal, num primeiro momento, e no Congresso Nacional, logo depois,  a aprovação do contrato de exploração e lavra do manganês amapaense, numa concessão com validade de 50 anos, dada à empresa Indústria e Comércio de Minérios S.A. – Icomi, subsidiária da norte-americana Bethelem Sthell. Aqui começa, de fato, a grande saga da mineração no Amapá.

A HISTÓRIA

Tudo começou no ano de 2004, no Estado do Amapá. A Icomi – Indústria e Comércio de Minérios S/A, após a extinção de seu contrato de lavra com a União, encerrou suas atividades e procedeu à desmobilização do seu parque de operações. Algum tempo depois, a Icomi passou a chamar-se Tocantins Mineração, por conta da compra dos seus ativos e passivos, pela Tocantins Mineradora, que tinha sido fundada a 2 de agosto de 1991, no Estado do Amapá. Data igualmente de 2004, a decisão da Tocantins Mineradora, depois transformada na Alto Tocantins, através de seus controladores, de associar-se à empresa denominada GoldMarca, com sede no  Panamá e sem qualquer precedente de trabalhos de exploração mineral no Amapá ou na Amazônia. Posteriormente, sem que seus sócios brasileiros fossem sequer comunicados, a GoldMarca mudou a denominação social para Iromem. Mas as sucessivas trocas de razão social não param por aqui. A Iromem virou a KWK e, finalmente, trocou outra vez de nome, passando a chamar-se Ecometals. A sede também mudou do Panamá para as Ilhas Bermudas, conhecido paraíso fiscal.
É importante mencionar que as duas empresas, Alto Tocantins e Ecometals, para efeitos de mercado, haviam formado uma juventure que, pelas características do contrato celebrado entre ambas, tinha todos os ingredientes para dar certo. Pelo acordo inicial, a Ecometals estava encarregada de fazer todos os investimentos financeiros necessários, assim como os aportes de capital no decorrer da pretendida parceria. A Alto Tocantins, detentora dos direitos de lavra de manganês no município de Serra do Navio (AP), entraria no negócio, lastreada no minério a ser extraído e, posteriormente, exportado pela Ecometals. No caso, apenas a União recebe 3% do valor de venda de minérios à título de imposto (royalties). O Estado do Amapá, nada recebe.
No referente à participação acionária e, consequentemente, na divisão proporcional dos lucros obtidos com a exportação do manganês, a empresa estrangeira, Ecometals, ficaria com 66% do capital e a Alto Tocantins com os restantes 34%, portanto, tornando-se minoritária, para efeitos de maiores decisões empresariais entre ambas.

Investimentos

Pelos desdobramentos futuros dessa joinventure Alto Tocantins versus Ecometals, hoje, perplexos, alguns especialistas do mercado mineral do Amapá, perguntam-se porque o projeto não deu certo. A resposta mais clara e exata, pode estar numa declaração do advogado e consultor Antonio Tavares Vieira Netto, atual presidente e controlador da Alto Tocantins. “Na realidade, fomos literalmente iludidos em nossa boa-fé. Hoje, passamos como os vilões da história, mas a verdade é bem diferente.” Em seguida, ele mostrou alguns documentos que comprovam que os aportes financeiros e de capital – contratados e de obrigação da Iromem – não ocorreram em sua integralidade em nenhum momento dos negócios recíprocos, muitos menos nos prazos previstos. Corria o ano de 2005 e a Iromem investiu no empreendimento mineral apenas US$ 1,2 milhão, quantia sabidamente insuficiente para enfrentar os consideráveis custos operacionais diretos de uma exploração mineral em escala, como a pretendida. Assim, a partir dessa época, não houve mais nenhum aporte financeiro, através da Iromem. Valendo mencionar que os estrangeiros da Iromem já estavam no Amapá, há seis anos, na pretensão de processar o manganês ainda existente em Serra do Navio.

Batalha Jurídica

Não havendo nenhuma justificativa para essa interrupção nos investimentos, segundo as obrigações contratuais assumidas, a direção da Alto Tocantins, por várias razões, considerou essa atitude como quebra formal de contrato. Isso, como seria de se esperar, gerou a inevitável batalha judicial e mais de 30 ações, de parte a parte, ingressaram na Justiça do Estado do Amapá.
Essas ações, entretanto, não impediram que novos acordos fossem realizados, entre a Alto Tocantins e a Ecometals, havendo evidente interesse da Alto Tocantins na normalização das pendências financeiras e a normal continuidade dos negócios.
Para complicar ainda mais esse relacionamento, numa manobra empresarial, em 2088, a Ecometals constituiu no Estado do Amapá, outra empresa, desta vez, denominada de Ecometals Manganês do Amapá, cujo objetivo especificado seria dar continuidade à participação societária com a Alto Tocantins, segundo as condições anteriormente acertadas entre ambas.
As relações recíprocas continuaram amistosas, apesar do clima de incerteza no desenvolvimento dos negócios. Foi quando em 2010, o advogado e antigo proprietário da Alto Tocantins, Jorge Augusto Carvalho de Oliveira, ingressou com ação judicial, visando anular os contratos anteriores com a Ecometals, ação que ainda tramita na Justiça do Amapá e não teve, até o momento, nenhum desfecho.

Golpe Internacional

No mundo dos negócios internacionais, as informações são uma das armas mais poderosas. Por isso, não tardou muito para que os sócios brasileiros da Alto Tocantins – após uma pesquisa e consultoria internacional – descobrissem com surpresa que a Ecometals não possuía recursos financeiros e nem de capital suficientes para colocar no negócio de exploração do manganês de Serra do Nvio. Mas, as surpresas seriam agravadas pela constatação dde que a Ecometals, numa típica jogada internacional, utilizando mecanismos do mercado, passou a realizar operações nas Bolsas de Valores de Toronto (Canadá) e de Berlin, onde negociou títulos. Títulos lastreados num negócio inexistente e num Estado brasileiro no qual a Ecometals entrou, pelas evidências hoje patentes, empunhando a bandeira predatória do pior e mais condenável aventureirismo comercial.

Extinção da Ecometals

Importa mencionar, nesse particular, que a Ecometals, nunca  existiu de fato. Sua constituição recebeu parecer jurídico negativo na Junta Comercial do Amapá (Jucap), que expediu duas certidões sobre essa pretendida constituição, a saber, no dia 9 de dezembro de 2011, havendo publicação anterior da portaria de cancelamento, no Diário Oficial do Estado, datada de 6 de dezembro de 2011.  Estava, para efeitos comerciais e jurídicos, plenamente extinta e sem direitos sobre os ativos e contratos – antes celebrados com a Alto Tocantins – que passaria a deter todos os mencionados direitos. Assim mesmo, contrariando normas legais, surpreendentemente, a Ecometals foi registrada na Jucap.

Nova fase

“Nosso maior objetivo agora é abrir o leque de contatos com possíveis parceiros e investidores nacionais e internacionais” – disse Antonio Tavares Vieira Netto, novo presidente da Alto Tocantins. Ele acha plenamente viável a comercialização do manganês estocado em Serra do Navio, ação que faria retornar àquele município, a curto e médio prazos, a realidade do correspondente recolhimento de impostos e também ao Estado, pelo aproveitamento da mão de obra e contratação de serviços. “O Estado do Amapá só tem a ganhar, participando de diversas maneiras nesse giro de investimentos, capitais e serviços” – disse ele.
Atualmente, o relacionamento da nova diretoria da Alto Tocantins com as autoridades estaduais e do município de Serra do Navio, é o mais cordial possível. Inclusive, já houve solicitação de audiência com o governador do Estado, Camilo Capiberibe, a fim de que possa ser exposto ao Executivo todas as fases do Projeto Serra do Navio, contemplando a reinversão no Amapá de parte dos eventuais lucros com a atividade mineradora. “Nós temos plena consciência do presente, mas também olhamos o futuro do Amapá com otimismo.” – finalizou o presidente da Alto Tocantins.
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(*) Bonfim Salgado é jornalista, consultor de empresas
e técnico em comércio exterior pela Funcex-SP.
Contato: [email protected]
bonfimjornal.blogspot.com

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