Solidão no distanciamento social físico: Oportunidade para o auto conhecimento

Renata Ferraz. Psicóloga Clínica

É da natureza humana se relacionar, uma vez que somos seres sociais, gregários e em constante processo de interação, haja vista que ninguém é bom o suficiente sozinho. Nossa vida é impensável sem relacionamentos, e é através destes que nos firmamos como pessoas já que as trocas de experiências adquiridas com o meio favorecem a construção da nossa personalidade e moldam nossa funcionalidade psíquica.

Desta forma, quanto mais competência temos para lidar com as pessoas, mais felizes nos tornamos. Negligenciar a importância das relações e/ou vínculos afetivos, desencadeia desequilíbrios emocionais e distúrbios mentais momentâneos. No cenário social moderno, muitos buscam uma forma mais solitária de viver (solitude), uma espécie de solidão relativa e não absoluta, pois para o ser social é impraticável sobreviver sozinho:  sem dialogar com amigos, família, colegas de trabalho e outros.

Em tempos de pandemia, as interações sociais têm sofrido interrupções, devido as medidas restritivas do distanciamento social, levando-nos à falta de conexão forçada, originando sentimentos de solidão com implicações profundas, um vazio interior potencializado pela vivência de sintomas reativos de insatisfações, tédio, angústia, medo, ansiedade e sofrimento psíquico, além de pensamentos negativos e mórbidos. A sensação de não pertencimento, aliada ao desamparo emocional experenciado pelo sentimento de solidão, impactam diretamente no significado da nossa existência e no funcionamento do nosso sistema imunológico, deixando-o vulnerável ao risco de desenvolver vários tipos de enfermidades.

Dentro deste contexto, vale ressaltar que a dependência emocional externa é patológica, visto que não precisamos da presença de alguém para emergir em nós a sensação de bem-estar físico/emocional. Ser ou estar introspectivo não é problema e nem um distúrbio psíquico, mas a cronicidade na dificuldade do estabelecimento das relações interpessoais, a falta da manutenção de vínculos fraternos e o sentimento de autossuficiência diante da indisponibilidade de interagir socialmente, acarreta consequências aversivas e disfuncionais, oportunizando o aparecimento de quadros clínicos severos.

Morar sozinho nesse período de quarentena pode ser um grande desafio, pois com o distanciamento social confronta a nossa fragilidade humana. A ideia da solidão maltrata, corrói nosso psicológico, precisando ser elaborada emocionalmente. Sendo assim, é necessário o entendimento do cenário do confinamento, não como isolamento total, mas sim como isolamento físico. Encontrar meios para minimizar o sentimento de desamparo, suprimindo parcial/total a sintomatologia psicossomática vivenciada é uma força tarefa, mas contribui para a estabilização emocional e a preservação da saúde mental.

Formar uma rede de apoio psicossocial, mesmo virtual, pode ser uma estratégia significativa e colaborativa para o enfrentamento da problemática. Manter-se conectado com amigos, familiares e demais pessoas nas redes sociais desfoca o desconforto do abandono e os efeitos malefícios que comprometem a saúde mental. Porém, em alguns momentos é inevitável que nós estejamos sozinhos, sendo necessário encarar a realidade e aceitar o momento vivido como uma oportunidade de autoconhecimento e readaptação de nossas percepções acerca da solidão, ressignificando- a.

Estar só não deve ser sinônimo de tristeza, mas um momento restaurador, propiciando benefícios físicos, emocionais e mentais. O apoio psicoterapêutico é sempre importante nestes casos, especialmente em uma época de restrição social tal qual a que estamos enfrentando. A terapia pode ajudar na identificação dos padrões de pensamento e de comportamento, reduzindo a sensação de isolamento, combatendo assim a solidão e nutrindo a saúde mental.

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