O fosso da desigualdade no capitalismo

* Charles Chelala. Economista. Professor. Mestre em Desenvolvimento Regional

A obra do economista francês Thomas Piketty, “O Capital no Século 21”, que será lançado no Brasil em setembro, é um dos maiores sucessos literários de todos os tempos, vendendo cerca de 200 exemplares por hora. A razão do estrondoso êxito é a abordagem de um tema quase sempre escamoteado nos debates do “mainstream” da economia: entender o porquê de o capitalismo ser tão injusto, produzindo imensa desigualdade social e, por que sua evolução só faz aumentar cada vez mais o fosso, ao invés de reduzir as disparidades.

Piketty faz uma pesquisa de fôlego em fontes primárias dos fiscos de diversos países, todos disponíveis no site “The World Top Incomes Database”. Chegou à conclusão que, no longo prazo, o retorno obtido sobre o capital, ou seja, a remuneração aos investidores na forma de lucros e juros é sempre superior ao desempenho global da economia. Com isso ele demonstra que a riqueza das pessoas localizadas no topo da pirâmide social cresce três vezes mais rápido do que o conjunto da economia.

O autor apressa-se em afirmar que não bebe da fonte marxista, renova sua fé no livre-comércio e critica a teoria elaborada por Marx da “Lei da tendência à redução da taxa de lucros”, sobre a qual abordarei a seguir. A solução proposta por Thomas Piketty é a taxação brutal sobre o patrimônio (fortunas e propriedades) o que permitiria, por um lado, reduzir a carga de impostos para a classe média e assegurar receita para gastos sociais na base da pirâmide.

Pois bem, a origem política da economia de mercado é a Revolução Francesa com o lema “liberdade, igualdade e fraternidade”. O capitalismo falhou nas três promessas, especialmente na promoção da igualdade entre seres humanos. Economistas tradicionais acreditavam na teoria de Simon Kuznets, que criou uma curva em “U” invertido com o seu nome, segundo a qual, o crescimento econômico inicialmente aumenta a desigualdade, mas a partir de certo ponto, a evolução do capitalismo promove redução da desigualdade. Tirando algumas exceções escandinavas (Suécia, Dinamarca, Noruega), a pesquisa de Piketty derrubou a teoria de Kuznets e levou junto a ideia de que o capitalismo premia o mérito de quem mais se esforça. Nada disso, quem nasce rico fica cada vez mais rico, enquanto os pobres têm imensa dificuldade em ascender socialmente.

Assim, apesar de negar, a obra corroborou com a teoria geral da acumulação capitalista de Marx. Para o marxismo, a origem do lucro é mais-valia, que só pode ser extraída da força de trabalho, que é remunerada em valor inferior à sua produção (geração de valor a mais). Com a evolução do capitalismo a produção tem que evoluir tecnologicamente, aumentando a composição de máquinas e equipamentos em relação à proporção de mão de obra. Com isso, perde-se a fonte e a taxa de lucro tende a cair indefinidamente, até o estágio da estagnação. Importante não confundir taxa de lucro com volume global de lucro extraído, que pode crescer com os ganhos de escala. O lado nefasto é que esta lógica leva inexoravelmente à concentração, uma vez que as empresas menos tecnológicas são fechadas ou absorvidas, o que gera, por um lado, poucos conglomerados extremamente poderosos e ricos e, por outro lado, amplia a quantidade relativa de pessoas marginalizadas. Piketty traz a comprovação estatística da teoria de Marx.

Outra vítima do livro é o neoliberalismo. Fica claro que, nos marcos do capitalismo, somente o Estado pode minimizar a desigualdade seja pela taxação aos ricos, seja pelos programas sociais dirigidos aos mais pobres.

  • Parabens pelo artigo, este deveria ser motivo de debates entre os intelectuais, academicos, politicos e a socieade em geral,

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