Discurso do senador Randolfe Rodrigues, na noite de ontem, na sessão do Senado

Plenário do Senado

Minha trajetória política foi embalada pela formação nas mobilizações sociais dos anos 1990 e no Partido dos Trabalhadores.

É em nome desta formação política que aprendi cedo que a corrupção, venha de onde vier, é um crime contra os mais pobres e que degenera os valores morais da sociedade.

A minha ruptura e a de centenas de militantes políticos com o PT a partir de 2003 e 2005 foi também para ser fiel a convicções como essa que nos foi ensinada pela própria luta social da esquerda.

O Governo Dilma e os 13 anos de governo petista estão sendo vítimas no dia de hoje dos algozes que ao longo do tempo acalentaram como aliados.

Essa experiência de governo que poderia ter se destacado no tempo com a ruptura com as velhas oligarquias políticas e com a concentração de renda em nosso País, para a realização de uma revolução democrática que a nossa história de 500 anos de espoliação nos impõe, transformou-se na concessão de partilha do poder com esta mesma elite.

Rompi com o PT especialmente pelas alianças e pelas conversões que cometeu.

Não me venham falar de oposição! Desde o primeiro de fevereiro de 2011, quando inaugurei meu mandato nesta Casa, aqui não participei dos acordos celebrados pelo próprio governo. Quando ninguém teve coragem, ofereci meu nome para disputar a presidência do Senado contra José Sarney, obtive 08 votos e denunciei a paz de cemitérios que aqui queriam estabelecer.

Não sou cúmplice de nenhuma das medidas recessivas encaminhadas a este Parlamento durante a gestão do ministro Joaquim Levy.

tAs escolhas estratégicas destes anos feitas pelo Governo foram para priorizar a aliança fisiológica e atrasada com este PMDB que agora o afasta do poder.

Em nome desta aliança e de outras com os setores atrasados sacrificaram a permanência neste Parlamento de um dos melhores quadros da trajetória da esquerda brasileira, que é o da companheira Heloisa Helena.

O sr. Henrique Meirelles, que nos próximos dias assumirá o Ministério da Fazenda do Governo Temer, foi anteriormente escolhido para dar continuidade a uma política econômica antipovo e antinação no Governo Lula.

Era a política econômica de juros altos, combinada com isenções fiscais absurdas que nos levaram ao grave problema fiscal que temos hoje e que se reflete nas altas taxas de desemprego.  O País chegou a essa situação não pelo bem feito aos de baixo, mas pela proteção dada aos de cima.

O Governo não combateu os esquemas de corrupção que surgiam exatamente para garantir a tal ‘governabilidade’ dividida com tais setores. Quem denunciava ou enfrentava essa ‘vanguarda do atraso’ aliada ao Governo era logo tachado e atacado.

A crítica ética foi rotulada como um desprezível moralismo pequeno burguês e a corrupção foi tolerada, desde que fosse de ‘esquerda’.

Por tudo isso, no Brasil de hoje, a tarefa número um é recusar e combater a corrupção, venha de onde vier.  É recusar o crime organizado de colarinho branco e adesivo partidário, ao mesmo tempo em que se impõe a repulsa mais veemente ao genocídio de jovens negros e pobres nas periferias.   São as duas faces da mesma moeda.

O atual Governo subestimou a questão climática, ridicularizou os desafios ambientais, negligenciou a sustentabilidade.

É verdade que tivemos neste período conquistas sociais.   Milhões ascenderam socialmente, mas essas próprias conquistas hoje estão ameaçadas.

Tudo isso poderia ter se convertido em mudanças estruturais se tivéssemos optado pela agenda de uma radical reforma agrária, urbana, tributária e política.

O Governo optou por um tipo temerário de governabilidade com aqueles que hoje são seus algozes.

Passei a minha trajetória política lutando contra esse tipo de aliança.   E não posso, neste voto, chancelar a ascensão ao poder dos representantes da carcomida política que tanto combati .

Não posso, principalmente devido ao programa e às medidas que estão agora anunciando, flagrantemente antipovo  e antinação.

Além do mais, o impeachment em nosso ordenamento jurídico-constitucional não é um processo de caráter exclusivamente político.   Ao contrário dos países que adotam a forma de governo parlamentarista, nossa Constituição não estabelece mecanismos de controles políticos primários entre o Chefe do Poder Executivo e o Poder Legislativo.   O Presidente da República não tem o poder de determinar a dissolução do Congresso Nacional, da mesma forma que não pode ser desligado da sua função por uma mera avaliação política da inconveniência de sua permanência pela maioria dos membros do Poder Legislativo.

“Sinto um mal-estar com esse fundamento.   A alegação é fraca e causa desconforto. Descumprimento de regra orçamentária é regra de todos os governos da Nação.   Não é por outro motivo que os Estados estão quebrados.  Há um problema sério de proporcionalidade. Não estou dizendo que ela não descumpriu as regras orçamentárias.  O que estou querendo dizer é que é desproporcional tirar uma presidente sobre esse fundamento num País como o nosso.   Vão aparecer dúvidas sobre a justeza dessa discussão.   Mais do que isso, essa dúvida se transformará em ódio entre parcelas da população.   Quanto à justeza e ao acerto político dessa medida, tenho dúvidas muito sinceras” (Ministro Joaquim Barbosa)

Estamos aqui diante de uma grave incoerência:  a Presidente da República será impedida de continuar governando no dia de hoje por ter assinado 06 decretos que totalizaram R$ 2,5 bilhões de reais.

A pergunta é inevitável:  Por que não foi também instaurado o processo de impeachment do vice-presidente Michel Temer, já que, entre novembro de 2014 e julho de 2015, o presidente em exercício da República assinou sete decretos de suplementação no valor total de R$ 10,8 bilhões?

Fonte: Banco de Legislação – Palácio do Planalto     

                       

O vice-presidente não pode alegar, em seu favor, que cumpriu ordens ou agiu por delegação. Já que nenhum agente público é obrigado a cumprir ordens manifestamente ilegais ou pode alegar desconhecimento da lei para eximir-se de responsabilidade. É o que diz o Art. 5º, inciso II, da Constituição Federal, em conjunto com o Art. 3º da Lei de Introdução ao Direito Brasileiro (LIDB) –  Decreto-lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942.

A opinião aferida nas ruas indica que o povo brasileiro não quer a continuação do Governo Dilma, mas também não aprova a instauração do Governo Temer, que tem igual responsabilidade pela crise que hoje vivemos.

A mesma pesquisa indica que o povo quer o direito de decidir.

A melhor alternativa seria realizarmos novas eleições presidenciais ainda neste ano.

E isso pode ser obra de um julgamento célere por parte do TSE da Ação de Impugnação de Mandato Eletivo nº 761, respeitando o devido processo legal, mas com a rapidez que exige a urgência deste momento gravíssimo da vida nacional.

Já é público e notório — e vem sendo comprovado nos autos daquela ação e em várias colaborações premiadas — que o dinheiro da corrupção foi utilizado para eleger a chapa Dilma/Temer em 2014. A resposta a esse grave momento da crise política deve ser a soberania popular.  Na dúvida, apostemos na democracia.

Por tudo isso não chancelarei com meu voto a continuação da crise que vivemos e o retorno ao poder das velhas e carcomidas elites políticas.

Voto, portanto, contra a admissibilidade da ação de impeachment contra a Senhora Presidente da República.

 

Assista o pronunciamento:

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  • RR perdeu a chance de se desvincular do PT. Não podemos esquecer que o Governo do PT tirou muita gente da miséria, deu oportunidade para o filho do pobre estudar, teve seus mérito, no entanto, não podemos fechar os olhos e negar a roubalheira escancarada e, o pior, nem um pedido de desculpa o povo brasileiro teve.
    O Brasil precisa de um governo com responsabilidade, não estou dizendo que o Temer será o melhor, porém caso não seja, tbm deverá ser afastado e assim com os demais.
    Já chega do discurso ”eu não sei de nada”.

  • Na verdade eu tinha grande apreço por esse senador,mas depois do discurso de ontem fiquei um pouco desconfiado,nao achei coerencia na sua fala,nos seus argumentos do NAO,no meu ver pelo discurso a abstençao ou a neutralidade seria o melhor posicionamento,e a minha humilde opiniao.

  • Essa postura do Randolfe não e estranha, como a maioria das crias que foram para essa REDE sempre em cima do muro, na verdade esta esperando o melhor momento para poder ver se o Temer vai oferecer alguma coisa para ele, pena que a eleição para Senador vai demorar, esse não ganha mais

  • Há 25 conheci Randolphe no primeiro curso de História da UNIFAP, todo menino ainda, mas com uma mentalidade e uma prática social que estava pelo menos 10 anos avançada ao seu tempo (dizia nosso professor de I. Economia, Clóvis, do qual não discordávamos). Era meu principal goleiro e eu centroavante em um time de futebol do Criciúma que criamos (quase imbatível naquela época). Foi ele que chancelou minha filiação no PT. Desfiliei-me muito antes dele, mas pelas mesmas razões, e nunca quis saber de qualquer outro partido político, minha militância hoje é outra. Fiz questão de sair de anos de silêncio para comentar o discurso do senador porque apesar de está infeliz pelos rumos que estão sendo dados à nação, fico feliz de saber que os brasileiros ainda podem contar com pessoas raríssimas, como Randolph, que dificilmente deixará de trilhar naqueles princípios compartilhados na juventude, pelo contrário, vejo-o mais maduro e firme, ainda à frente de um tempo, cuja teimosia de conservadores, atrasa os rumos de nossa História.

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