Hidrelétricas, impactos e lamentos

* Marco Chagas. Doutor em Gestão Ambiental 

 
Em 2008 fui contratado pela empresa Odebrecht para coordenar os estudos ambientais das hidrelétricas de Ferreira Gomes e Cachoeira Caldeirão. A princípio, tentei entender os motivos pelos quais uma empresa do porte da Odebrecht confiaria num técnico do Amapá para tamanha missão. Quando conheci os diretores da empresa, Antonio Augusto e André Queiroz, dois jovens, com ideias ousadas e propondo que os projetos das hidrelétricas fossem trabalhados para tornarem-se projetos de desenvolvimento local, logo percebi que teria uma oportunidade para testar várias teorias do meu doutorado e contribuir para melhoria da qualidade de vida no Amapá.
Foram dois anos de intenso trabalho, dedicação e muitas reuniões. Minha missão foi facilitada pela colaboração e competência de técnicos do Amapá, contratados para estudos específicos. Inserimos nos estudos várias propostas vinculadas a possibilidade de iniciar um processo de negociação público-privado para melhoria da qualidade de vida na região, mesmo sabendo que estávamos desrespeitando os manuais de elaboração de estudos ambientais.
Para ficar claro, a maioria das empresas entende que propostas nos estudos ambientais devem estar vinculadas somente aos impactos. No mundo dos negócios não há muita margem para invadir o campo da responsabilidade pública, pois existe uma premissa no Brasil de que os governos propagam o desenvolvimento, mas são omissos quanto as responsabilidades pelos impactos.
Os estudos ambientais das hidrelétricas de Ferreira Gomes e Cachoeira Caldeirão dão sustentação para elaboração de um plano de desenvolvimento local. Minha frustação começou quando a Odebrecht perdeu os leilões das hidrelétricas e percebi que somente um governo forte seria capaz de evitar que os projetos se tornassem algo à margem do Amapá ou que somente fosse propalado como gerador de emprego (temporários) e de impostos.
Não aceito a condição de que qualquer projeto que utilize recursos naturais não assuma a responsabilidade de contribuir para a melhoria da região onde se insira para além de empregos e impostos. Mas o que fazer quando a intervenção dos governos acontece no sentido de aumentar a insegurança dos projetos, a corrupção e a discricionariedade pelo excesso de autoridade que todos julgam ter?
Lamento muito o ocorrido em Ferreira Gomes e não descarto outros acidentes de maior proporção. Lamento muito também a forma irresponsável como os governos conduzem os processos de licenciamento ambiental, a maioria objeto de negociação de apoio político e de irrisórias compensações que não voltam para beneficiar aqueles que perderam com os impactos dos projetos.

  • Grande Mestre! Parabéns mais uma vez pela lucidez dos comentários.
    Antes de mais nada a punição deve vir a galope para aqueles que irresponsavelmente aprovaram os estudos ambientais, sejam eles quem sejam. E claro punir a empresa, pela irresponsabilidade construtiva. Houve erro e assim sendo deve ser imputado aos responsáveis que devem arcar com as consequências.

  • Parabens a Marcos Chagas pela bela abordagem sobre licenciamentos ambientais de grandes projetos no Amapá.

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