A Renca ronca

*Vicente Cruz. Advogado

Até a semana passada o nome Renca só era conhecido nos campos de pelada dos subúrbios da Amazônia, onde a galera da bola costuma dar apelidos esquisitos aos peladeiros da famosa partida de futebol disputada no final da tarde entre os marmanjos do bairro. De lá pra cá virou palavra comum entre os militantes de esquerda, intelectuais, artistas e um grande número de abelhudos, após um desastroso decreto do Presidente Temer que extinguiu a reserva nacional do cobre e associados (Renca), área localizada entre os estados do Pará e Amapá.

O ato normativo ganhou repercussão midiática quando os militantes de esquerda, ambientalistas, artistas, intelectuais e abelhudos, cunharam o ato como um entreguismo nacional do impopular e ilegítimo governo Temer. Para eles, a soberania nacional estaria ameaçada com a extinção da Renca, sob o argumento de que empresas mineradoras multinacionais viriam fazer a exploração das riquezas minerais nela existente, provocando impactos ambientais irreversíveis e desastrosos para a Amazônia e para a humanidade.

Para qualquer país do mundo ter riquezas minerais em seu subsolo sempre representou possibilidade de riqueza e progresso. Para alcançar esse desiderato, a exploração mineral é um imperativo lógico dessa privilegiada situação, porquanto se revela inimaginável um país ter expressivas riquezas minerais e não as explorar economicamente para promover o seu desenvolvimento. O debate necessário, então, seria saber como poderia ocorrer a exploração dessa riqueza sem que o meio ambiente pudesse ser afetado de tal forma que inviabilizasse o empreendimento. Seria dizer: teria que se pensar numa maneira de exploração dos recursos minerais de forma sustentável.

Ocorre que o debate travado em torno do decreto de extinção da Renca é uma patifaria intelectual, pródiga nos terrenos arenosos da militância de esquerda e dos ambientalistas. Na verdade, os inflamados debatedores aproveitaram a canelada de Temer para aumentar ainda mais a impopularidade do presidente que acabou de escapar da degola, graças à força de sua base parlamentar. O objetivo do debate está longe de ser a defesa séria e intransigente do meio ambiente ou da Amazônia. Por trás de tudo isso, está uma velada e cruel luta pelo poder num ringue em que vale tudo, inclusive dedo no olho. Se assim não fosse outras agressões ambientais em curso, de grosso calibre, estariam sendo combatidas com a mesma veemência, como bem lembra o polêmico jornalista e sociólogo Lúcio Flávio Pinto, um especialista em Amazônia, em artigo recentemente publicado.

O engraçado nisso tudo é democratização do debate com a ativa participação dos abelhudos. Enquanto os artistas tem um papel estético na contenda e os intelectuais um papel de relevo para dar cunho de seriedade à patifaria intelectual, os abelhudos servem para divertir quem assiste a isso tudo com o pé no chão e o ouvido atento.  De fato, os abelhudos falam como se fossem intelectuais especializados no assunto, mas divertem o respeitável público como palhaços do circo ambiental. Os abelhudos, como não tem autoridade no assunto, cercam-se de argumentos estapafúrdios, inaplicáveis ao caso concreto e sem a malícia da patifaria dos intelectuais. Seus argumentos dilaceram os ouvidos de suas vítimas com os discursos decorados dos velhos manuais comunistas ou das lições de Eduardo Galeano, depois fumam e dormem, enquanto a Renca ronca em seu profundo e improdutivo sono, sem ouvir os debates e dar bola aos decretos, com sua miserável virgindade a serviço do ócio.

 

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